(Marina Colasanti)
"Eu sei que a gente se acostuma. Mas não devia.
(...)
A gente se acostuma a acordar de manhã sobressaltado porque está na hora.
A tomar café correndo porque está atrasado.
A ler jornal no ônibus porque não pode perder tempo da viagem.
A comer sanduíche porque não dá pra almoçar.
A sair do trabalho porque já é noite.
A cochilar no ônibus porque está cansado.
A deitar cedo e dormir pesado sem ter vivido o dia.
(...)
A gente se acostuma a esperar o dia inteiro e ouvir no telefone: hoje não posso ir.
A sorrir para as pessoas sem receber um sorriso de volta.
A ser ignorado quando precisava tanto ser visto.
(...)
Se acostuma a não ouvir o passarinho, a não ter galo de madrugada, a temer a hidrofobia dos cães,a não colher fruta no pé, a não ter sequer uma planta.A gente se acostuma a coisas demais para não sofrer.
Em doses pequenas, tentando não perceber, vai se afastando uma dor aqui,um ressentimento ali, uma revolta acolá.
(...)
A gente se acostuma para não se ralar na aspereza, para preservar a pele.
Se acostuma para evitar feridas, sangramentos, para esquivar-se da faca e da baioneta, para poupar o peito.
A gente se acostuma para poupar a vida que aos poucos se gasta e, que gasta,de tanto acostumar, se perde de si mesma."
Esse blog tá ficando cada vez mais intimista, mas não devia, rs. Pelo menos não era a intenção... mas deixa estar, deixa ver o que é que vai dar...
E mais um texto/poema aí. Me lembrei dele após uma conversa trivial, hoje. Daquelas que te fazem pensar e repensar sobre um monte de coisas, sabe?
("querem que eu entre na massa, que seja mais um.. programado, conformado em só existir...")
P.S.: chuvinha booouua.. tempo louco! ;)
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