domingo, 19 de fevereiro de 2012

E a dor, José?

A minha dor eu sei resolver. Ainda que seja a custo alto, sei resolver. Pode ser com um calmante, um trabalho físico, um desabafo. Pode ser mexendo na horta, organizando as coisas no armário, limpando a casa, xingando Deus;eu sei resolver. Ainda que demore, resolvo.
O que não sei resolver é a dor do outro. Fico mudo, meu braço sobra,minha mão falta, minha boca treme algum vento sem força.
(...)
A dor do outro me isola. Tento uma brecha para falar, mas sinto-me intruso,incômodo, solteiro.Como uma casa em reforma.
(...)
Toda dor só é compreensível no idioma da dor. Quem está de fora não entende,não tem razão,não alcança sentido. A dor não busca conselhos; a dor busca a pele para colocar por cima, busca cicatrizar a ferrugem e a maresia.
(Carpinejar, de novo)




A dor do outro me paralisa tanto que até as palavras me faltam. Mas ainda bem que existem poetas por aí, dos quais posso roubar palavras e até os sentimentos. Aonde quer que eu vá, eu descubro que um poeta esteve lá antes de mim (Freud).
Mas, por mais que a poesia seja minha voz, ela pouco ajuda na função de  braços. E agora, José?


Em meio à  sensação de certeza, conhecimento, potência... quando você se sente seguro por ter sido marcado pela Verdade que esteve aqui, e descoberto mil pontos de contato e etc. e tal...a vida surpreende. Sempre surpreende, José.
Afinal, a vida real não é uma equação, apesar de ser repleta de incógnitas.


Mas me diga, José... e agora? 
O que fazer com a moça bonita, vítima de violência sexual, que lhe aparece no sábado de Carnaval?
O que fazer ao presenciar  um "aborto legal", quando você parece sofrer mais que a "mãe ilegal"?
O que fazer com aqueles que estão esperando apenas pelo dia da morte, quando não há mais nada a fazer?
O que fazer com quem não sabe o que fazer, e você não tem tempo (ou paciência...) pra ensinar?
O que fazer?
Me responda, José...

A minha dor eu resolvo. A dor do outro eu não sei aonde colocar, onde me colocar.

2 comentários:

Jeq* disse...

“Dor não tem nada a ver com amargura. Acho que tudo que acontece é feito pra gente aprender cada vez mais, é pra ensinar a gente a viver. Desdobrável. Cada dia mais rica de humanidade.”
(Adélia Prado)

Natalia Cortelette disse...

Eeei Jeq! Escrevi no domingo depois de ler e pensar mto sobre isso q vc escreveu.. nada mais justo q deixá-lo aqui..

Um egoísmo farto enche nossos pulmões
onde outrora eram ocupados pelo fôlego da Vida
que não mais reconhecemos em nossos atos.
Injustiças, mentiras, desigualdades, desonestidades
é o que se vê por aí
por aqui, em minhas mãos.

É o olhar da indiferença, da insensatez
da palidez de mentes fartas do vazio.
Onde está o amor?
A dor é mato por onde passo
no repasso da existência
me desfaço

Sim. Não mais vivo eu
mas o ego da cegueira
tomou conta de mim.

Senhor,
que a mente seja crítica
que as mãos façam o bem
que o olhar gere esperança
que a mesa gere vida
que a diferença se estabeleça

Por favor, que o Teu Reino começe
em mim, em nós.